quarta-feira, 23 de abril de 2014

Silenciar o pensamento é preciso!

“Porque é segundo tuas palavras que serás justificado e é segundo tuas palavras que serás condenado.” Mt.12.37
            As palavras possuem enorme poder, através delas podemos edificar ou destruir, dar vida ou matar, alienar ou libertar, por isso, faz-se necessário antes refletirmos muito no que vamos pronunciar. É nesse exato momento de reflexão que o silêncio tem importância vital, permitindo que a nossa voz interior não nos deixe cometer equívocos e consequentemente pronunciamos palavras precipitadas que podem causar graves danos tanto em nossa vida quanto na do nosso próximo.
            O silêncio é mais do que um ato de sabedoria, é uma disciplina urgente que a humanidade precisa desenvolver. Muitas vezes não atingimos nossas metas por intermédio do ato de falar. O silêncio, em grande parte de nossa vida é muito mais representativo e pode nos fazer atingir nossos objetivos de uma forma mais adequada. Através dele podemos expressar mais do que muitas palavras sem que isso signifique falta de capacidade ou conhecimento.
            O silêncio sempre foi reverenciado e cultuado dentro das diversas tradições religiosas do mundo. No cristianismo monástico o silêncio no qual cada um de nós é convocado a entrar, é o silêncio eterno de Deus. Este silêncio pode ser encontrado no coração e cultivado através da disciplina da meditação. Na maioria das religiões espiritualistas, o silêncio é o caminho para a unidade, é através dele que descobrimos que a vida exterior e interior estão unificadas. Esse silêncio que precisamos desenvolver deve estar além de todas as palavras, ideias, pensamentos e imaginação, pois somente assim podemos sentir paz e liberdade.
            A tradição bíblica judaica do Antigo Testamento nos mostra vários casos onde o silêncio foi fundamental para o êxito do povo eleito. Uma das grandes virtudes dos descendentes de Benjamim (filho de Jacó), era saber ficar em silêncio nos momentos certos. O rei Saul, escolhido como o primeiro rei de Israel, era descendente da tribo de Benjamim. Ele fez bom uso do silêncio, conforme consta na Tanach (bíblia hebraica). Quando o profeta Samuel comunicou-lhe que seria rei, ele não mudou seu comportamento e continuou sendo a mesma pessoa, não lhe subindo à cabeça o fato de ser o futuro rei, tanto que nem fez questão de contar a seus familiares.
            Durante o período do Purim, em meio ao exílio persa, o povo de Israel também foi salvo devido ao silêncio da Rainha Ester, que obedecendo à ordem de Mordechay, não falou ao rei sobre suas origens. Tanto Mordechay quanto a rainha Ester eram também descendentes da tribo de Benjamim.
            Em uma parashá (porção semanal de textos estudados na Torá), fala que após a tragédia que acarretou a morte de dois filhos de Aarão, este se silenciou, como relatado na Torá: “Vayomer Moshê El Aharon hu asher diber Hashem lemor bricovay ecadesh veal pene chol haám ecaved vaydom Aharon (Vaycrá 10:3) – “E disse Moisés a Aarão: Isto é o que falou o Eterno dizendo: Por meus escolhidos me santificarei e perante todo o povo Eu serei glorificado. E calou-se Aarão.” Segundo a sabedoria judaica, o difícil silêncio de Aarão, nesse momento de dor, demonstra conformismo e confiança na justiça divina, onde mais tarde esse seria recompensado com a visita do próprio Todo Poderoso.
            Segundo outro sábio israelita, o Maharal de Praga zt”l, em seu livro Dêrech Hachayim, escreve que o poder da fala é um poder físico (do corpo) e o raciocínio é um poder espiritual. Estes dois fatores antagônicos não podem trabalhar simultaneamente dentro do indivíduo. Portanto, o silêncio é essencialmente importante para que possamos evitar erros e atitudes precipitadas, uma vez que quando falamos, estamos de certa forma, anulando o raciocínio. Mahatma Gandhi fala o mesmo na seguinte frase: “Aqueles que têm um grande autocontrole, ou que estão totalmente absortos no trabalho, falam pouco. Palavra e ação juntas não andam bem. Repare na natureza: trabalha continuamente, mas em silêncio.”
            Mabel Collins em seu livro Luz no Caminho, diz: “Do seio do silêncio, que é a paz, uma voz ressoante se elevará. E esta voz dirá: Faz falta alguma coisa mais; tu colheste, agora tens que semear. E sabendo que esta voz é o silêncio mesmo, obedecerás. Tu que és agora um discípulo capaz de manter-te firme, capaz de ouvir, capaz de ver, capaz de falar, que venceste o desejo e obtiveste o conhecimento de ti mesmo; tu que viste a tua alma em sua flor e a reconheceste e que ouviste a voz do silêncio, encaminha-te ao Templo do Senhor e lê o que ali está escrito para ti.” Analisando esse texto, entendo que ouvir a voz do silêncio, é compreender que a única direção verdadeira vem do interior, da intuição, da via do coração; encaminhar-se ao Templo do Saber, é entrar no estado em que é possível aprender verdadeiramente.
            A superioridade do silêncio é demonstrada por Jesus perante Pilatos: “E, sendo acusado pelos principais sacerdotes e pelos anciãos, nada respondeu.” Mt. 27.12. “Jesus não respondeu nem uma palavra, vindo com isto a admirar-se grandemente o governador.” Mt. 27.14.
            Para finalizar, lembro que muitas vezes, o silêncio fala mais do que muitas palavras, e através dele nos tornamos mais sensíveis, humildes e misericordiosos. Busque a disciplina do silêncio e verás como sua vida irá mudar para melhor, passando a ser um indivíduo mais equilibrado e seguro diante desse mundo conturbado e enlouquecido em que vivemos atualmente.

in Silenciar o pensamento é preciso!

sábado, 5 de abril de 2014

AQUI E AGORA

É estranho estar aqui e agora. O mistério nunca nos deixa sozinhos.

Por detrás da imagem, por debaixo das palavras, por cima dos pensamentos, o silêncio de outros mundos nos aguarda. Há um mundo que vive dentro de nós e do qual mais ninguém nos pode trazer notícias deste mundo interior.
Através das nossas vozes, trazemos para fora o som da montanha sob a nossa alma, estes sons, são as palavras que exteriorizamos. 
Há tantos a falar ao mesmo tempo, falando em voz alta, falando em silêncio, sussurrando-nos, intuindo-nos, nos quartos, nas ruas, na TV, no rádio, no jornal, em livros. O barulho das palavras mantém o que chamamos o mundo de lá fora para nosso interior. Apercebemos dos sons de uns e de outros criando padrões e previsões, bênçãos, e blasfémias.
Cada dia, a nossa tribo de língua mantém o que chamamos de 'mundo' juntos, no entanto, a enunciação do mundo revela como cada um de nós cria implacavelmente o exterior no ‘mundo interior’, armazenando aí a imagem do exterior que nos é dada pela limitação dos sentidos físicos. Todos somos um artista no mundo interior. Cada um traz o som do silêncio e persuade o invisível a se tornar visível.
Os seres humanos são novos aqui. Acima de nós, as galáxias dançar para fora em direcção ao infinito. Sob os nossos pés é a terra antiga. Estamos muito bem moldado a partir desta argila. No entanto, a menor pedra é milhões de anos mais velha do que nós e nos seus pensamentos, o universo silencioso procura eco no nosso interior.
Um mundo desconhecido aspira para a reflexão, as palavras são os espelhos oblíquos que detêm o seu pensamento. Olhamos para esses espelhos da palavra e tentamos vislumbrar o significado, na busca incessante de abrigo e protecção do desconhecido.
Se nós nos tornamos viciados na nossa interioridade externa iremos assombrar-nos com o nosso EU. Para ser saudável, devemos permanecer verdadeiros à nossa complexidade vulnerável, a fim de manter o nosso equilíbrio, precisamos manter o interior e o exterior, visíveis e invisíveis, conhecidos e desconhecidos, temporal e eterno, antigo e novo juntos. Ninguém mais pode realizar essa tarefa excepto nós mesmos. Somos o único limite do nosso mundo interior. Esta integridade é a obrigatória.
Por detrás da fachada de imagem e distracção, cada pessoa será sempre um artista neste sentido primordial e incontornável. Cada um de nós está condenado e privilegiado a ser um artista interior que carrega e molda um mundo único.
A presença humana é um sacramento criativo e turbulento, um sinal visível da graça invisível.